Antônio Augusto Mayer dos Santos prega o fim do quociente eleitoral.O advogado especialista em Direito Eleitoral Antônio Augusto Mayer dos Santos não acredita na aprovação dos temas da reforma política em debate no Congresso Nacional, como o financiamento público de campanha e o voto em lista. Os itens constam no parecer do relator da Comissão da Reforma Política, o deputado federal Henrique Fontana (PT-RS), mas devem enfrentar resistência de bancadas com peso político e decisivas para a formação de quórum. Antônio Augusto não vê a curto prazo nenhuma mudança significativa no processo eleitoral. “Não se votará nada (na Câmara dos Deputados) que tenha possibilidade de ser revisado pelo Senado. Então, 2012 será igual a 2010”, projeta.
O advogado entende que o financiamento público de campanha não é a solução para tornar a disputa mais igualitária nem para impedir a corrupção. Ele avalia ainda que outros temas, como o fim do quociente eleitoral (cálculo que determina quais partidos e coligações terão cadeiras nos legislativos), a diminuição do número de deputados federais, a redução de oito para quatro anos dos mandatos dos senadores, o limite de gasto de campanha por cargo eletivo e a restrição de doações de bancos, seriam mais prioritários para uma real melhora do processo eleitoral.
Jornal do Comércio - A reforma política avançará? Há a expectativa de votação em novembro na Câmara dos Deputados.
Antônio Augusto Mayer dos Santos - Os itens da reforma em debate não passam porque, além das questões partidárias, o que se sobrepõe são as bancadas do Norte e do Nordeste, que são como um partido político informal. Tudo que criar ameaça ao sistema vigente vai esbarrar nestas bancadas. Elas têm a joia da coroa na mão, que é o quórum. Sem as bancadas do Norte e Nordeste, suprapartidariamente falando, não sai discussão no Congresso. Atribuo esse obstáculo ao fato de que nesses estados há uma oligarquização viciada do processo eleitoral. E há também a bancada do Sudeste, por conta de Minas Gerais e São Paulo, com um peso definitivo. Então, financiamento público, voto em lista e voto distrital vão esbarrar nessas bancadas. Além disso, essas medidas não são solução para os problemas que afligem a realidade política do País. São propostas bem-intencionadas, fundamentadas, amparadas em pressupostos respeitáveis, todavia apartados da realidade.
JC - É contrário ao financiamento público das campanhas?
Antônio Augusto - Sim. Não é garantia de preservação da igualdade das candidaturas. Minha sugestão é aumentar o rol de doadores que estão restritos, ampliar essa classificação que a lei estabelece e proibir que segmentos poderosos como bancos e financeiras participem do processo eleitoral. Uma alternativa mais sensata do que o limite de gasto de campanha através do financiamento público seria o limite de gasto por cargo (de vereador a deputado federal e de prefeito a presidente). O financiamento público como solução messiânica é mais uma ilusão. E tenho convicção de que vai ser indutivo de outros caixas. É inadmissível uma guinada tão drástica no processo de financiamento de campanha quando se tem algo já estabilizado no País, que são as doações privadas. Ou seja, eu, candidato, não posso movimentar um dinheiro meu, auferido pelo meu trabalho, para me financiar porque será proibido. Vou depender exclusivamente da boa vontade dos dirigentes do meu partido. A minha percepção de reforma política é outra. É micro, não é macro. Tem que alterar questões relacionadas ao cotidiano.
JC - O que seria a reforma política ideal?
Antônio Augusto - Em primeiro lugar, a eliminação do quociente eleitoral. Foi introduzido no Brasil em 1932, quando votavam apenas 6% da população, hoje mais de dois terços da população são eleitores. Outro fato é que temos 27 partidos registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), com perspectiva de serem 32. Não podemos estabelecer a mesma realidade política da década de 1930 à realidade do terceiro milênio. O quociente não é garantia de vitória eleitoral para as minorias. Um exemplo é o caso da ex-deputada federal Luciana Genro (P-Sol), que fez 130 mil votos por um partido em ascensão, que tem bancadas em estados politizados. Em 2010, com a votação que fez, (Luciana) se sobrepôs aos três últimos deputados federais eleitos do Rio Grande do Sul. O que determinou a não reeleição dela foi o quociente eleitoral. Tenho um estudo que demonstra que, na eleição do ano passado, dos 27 estados da federação, 21 tiveram casos similares e em todos houve perda de qualidade na respectiva bancada.
JC - E além do fim do quociente eleitoral?
Antônio Augusto - Outra medida é garantir mais fiscalização nos parlamentos. A redução (do número de cadeiras) na Câmara dos Deputados e a redução do tempo dos mandatos de senadores (de oito para quatro anos) ampliariam a possibilidade de uma fiscalização mais efetiva. Hoje são 513 deputados federais, e me filio à proposta de emenda constitucional do falecido deputado Clodovil Hernandes (PR-SP), que sugeria 280 integrantes, para racionalizar a estrutura da Casa. Outro elemento vital para resgatar a credibilidade na política é a vedação da convocação de suplente no recesso.
JC - O interesse público tem esbarrado no senso de corporativismo de quem está no poder?
Antônio Augusto - Há uma necessidade de audiências públicas, onde as pessoas possam usar microfone, mandar e-mail direto para os deputados. Afinal de contas, é uma matéria de relevo imediato. Introduzida a alteração, há reflexo na eleição seguinte. Essa discussão sobre a reforma política precisa ser de domínio público, sair dos corredores de Brasília.
JC - Concorda que há falta de interesse da população nesse debate por conta da estigmatização do meio político, visto como corrupto?
Antônio Augusto - O cidadão está descrente e, além disso, tem desprezo pela política. Essa combustão é perigosa quando tratamos de mandatos, voto e eleições.
JC - Como inverter isso?
Antônio Augusto - Tornando isso visível. A primeira manifestação dessa visibilidade é a audiência pública. É um absurdo que se discuta reforma política só em Brasília e em um semestre. É um deboche estabelecer uma discussão dessa envergadura em seis meses.
JC - Qual é a solução então?
Antônio Augusto - Votar o que já se tem. Segundo, abrir as portas do Congresso e fazer com que os parlamentares viagem o País explicando o que é a reforma política. Terceiro, visitar aqueles locais onde a corrupção eleitoral apresenta índices alarmantes. O sistema dá sinais de fadiga. A ponto de o TSE ser provocado a discutir a anulabilidade de eleições em função de votos brancos e nulos. É um dado alarmante.
JC - A curto prazo, não haverá grandes mudanças?
Antônio Augusto - Não se votará nada (na Câmara) que tenha possibilidade de ser revisado pelo Senado. Então, 2012 será igual a 2010. Para 2014, arrisco o palpite quanto à eliminação das coligações para disputas proporcionais.
JC - E a lei da ficha limpa, trará resultados em 2012?
Antônio Augusto - Como está hoje, o candidato que responde a processo é elegível. Não acredito que a restrição à candidatura de alguém condenado se sustente nos pleitos de 2012, 2014, 2016...
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